Descobri os fóruns de tentantes depois que pesquisei “como engravidar” no Google no último verão. Estava sozinha na cama às 7 da manhã e aquela pesquisa me pareceu ilícita. Não porque envolvia sexo, mas porque Avi e eu havíamos concordado em começar aos poucos, tentar casualmente, ver o que acontecia. Pesquisar sobre o assunto cheirava a determinação. E “como engravidar” não era algo óbvio?
Aprendi sobre isso na quarta série, sentada no banco do passageiro no carro da minha mãe, já na porta de casa, depois que perguntei o que acontece quando alguém fica grávida sem querer. O questionamento foi menos avançado do que parece — na minha cabeça, gravidez era como um vírus, algo que você pega como uma gripe. Ela me explicou como funcionava e, pelos próximos 24 anos, tomei cuidado para não fazer um bebê como quem evita uma doença.
Agora eu estava mais interessada nos detalhes. Os detalhes que esses fóruns têm aos montes. Poderia ler sobre os horários específicos em que as pessoas fazem sexo e em qual posição. Poderia ler sobre o que especificamente elas comeram, qual era a marca do teste que elas fizeram, e qual o tipo de xixi (o da manhã ou o da tarde? depois de beber muita água ou pouca água?) analisado. Poderia aprender sobre os primeiríssimos sinais e gravidez — como cócegas no seio direito — e em qual dia após a ovulação eles foram sentidos.
Esperança e vulnerabilidade
A maioria das pessoas conseguiu seu positivo depois de um dia ou dois de atraso na menstruação, mas isso é tempo demais para esperar. As participantes queriam saber se estavam grávidas o mais rápido possível, e elas se agarravam a essa esperança o máximo que podiam, mesmo quando estavam sangrando e com cólicas, diante de um sinal negativo no teste. “Cólica menstrual e escape antes do positivo?”, seus posts inquiriam. Sim, sim, sim, elas respondiam em coro, é possível!
A esperança corria pelos fóruns de tentantes como um míssil, contagiosa e cinética até desaparecer no horizonte, de novo e de novo. Os posts eram sobre tentar, afinal. As pessoas que conseguiam acabavam migrando para fóruns de gravidez e maternidade. Talvez isso seja parte do problema para mim: todas essas tentativas nos fóruns de tentantes. O desespero que irradiava das perguntas (“Minhas juntas doem, será que é um sinal?”). Até agora, ao longo da minha vida, a ausência de esforço tinha tido muito mais apelo – na hora de me vestir, nas atitudes e na hora de engravidar. Não demonstrar esforço significa jamais externalizar uma condição de falta, de ausência. Apesar de tudo era exatamente assim que me senti ano passado: estranha, isolada, como se algo estivesse faltando. Meio como uma perdedora.
Os fóruns me forçaram a reconhecer algo que estive evitando — o desejo em si. Eu queria querer de uma maneira distanciada, e ali estavam mulheres vulneráveis e sem vergonha alguma do próprio desejo, buscando refúgio e suporte para o bem delas e para o meu. Em segredo, eu as amava por isso.
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Por um tempo estive inconsciente da minha hipocrisia, posicionando elas como muito diferentes de mim. Quando minha terapeuta perguntou como eu me sentia naqueles fóruns e eu respondi “constrangida”, ainda demorei um longo tempo para perceber que não estava me referindo aos jargões ou às jovens noivas ansiosas. Eu estava constrangida antes de mais nada por mim — pelo meu simples desejo de ter um filho, algo que eu considerava piegas e prosaico se comparado às minhas outras ambições. Essa nova busca parecia dividir a minha identidade em dois. Metade de mim estava rindo com minhas amigas sobre o eufemismo “namorar” na hora de se referir ao sexo, enquanto a outra estava pesquisando qual é exatamente o melhor momento para transar. (…)
As principais conversas sobre filhos que eu estava acostumada diziam respeito aos problemas ligados à parentalidade: legalização do aborto, mudanças climáticas, os dilemas éticos da adoção, o aumento assustador de tiroteios nas escolas, a influência destrutiva da família nuclear, os danos que a maternidade causa à carreira e à saúde mental das mulheres, a alarmante ausência de suporte para os pais no ocidente, o esforço para desestigmatizar uma vida sem filhos e celebrar trajetórias de vida menos tradicionais, etc. Todas essas conversas são importantes e válidas. Mas nenhuma delas está exatamente incentivando as pessoas a ter filhos.
Então, quando passei a prestar mais atenção, identifiquei outras posturas que pareciam estar sempre ao meu redor na minha vida na cidade grande. Uma vida plena e cosmopolita, até onde imaginava, não era uma vida feita de trocar fraldas e levar crianças na escola, mas uma vida cercada de arte, cultura, viagens e reinvenção. Uma vida que rejeita os marcos normativos do casamento e da maternidade. Sentia que as pessoas estavam igualmente desinteressadas tanto naqueles que têm filhos e se mudam para o interior quanto em quem tem filhos e permanece na cidade grande, ocupando as calçadas com seus carrinhos de bebê atrapalhados. Nenhum deles se encaixa na narrativa libertadora de Nova York enquanto uma cidade para se viver plenamente como alguém interessante e interessado.
Até meu algoritmo do TikTok acompanhou minha paranoia, me mostrando vídeos de figuras urbanas revirando os olhos para os “procriadores”. Um deles me soou particularmente contundente: um cara confessando que sempre fingia estar feliz por seus amigos grávidos enquanto tirava sarro deles pelas costas. O universo dos fóruns de tentantes parecia estar a milhas de distância.
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Parte de mim sabia que o sentimento anti-filhos era apenas uma fachada para muita gente na faixa dos 20 anos — uma projeção de juventude liberal e urbana que não se sustentava quando vista de perto. Da mesma forma, conhecia muitas pessoas com filhos que estavam prosperando, que eram criativas e presentes (e sabia também que quando esse não era o caso, a falha era coletiva, e não individual). Mas não conseguia não absorver um pouco da antipatia, mesmo que superficialmente. Por mais fácil que fosse para mim desconsiderar a ideia que ter filhos era uma excentricidade ou algo que acabaria com a minha vida, eu ainda queria pertencer a esse mundo, não queria ser esquecida ou deixada para trás como amiga, mulher, escritora, crítica, nova iorquina.
A ausência dessa ansiedade em Avi chamava atenção, inclusive. Ele não entendia por que eu me sentia julgada por querer um filho, o que até me deixaria com raiva, se não tivesse me deixado constrangida primeiro. É por isso que os fóruns eram meu segredinho. Por fora, uma piada particular; por dentro, um conforto. Tentar engravidar me deixou tão maluca e tão fora de mim que nem foi difícil separar minha consciência dessa forma. Infelizmente esse movimento não foi especialmente sustentável.
Uma pena que eu tenha feito o gesto clássico de pegar meu conflito interno e projetá-lo na forma de julgamento contra outras mulheres. Acho que isso me deu uma certa distância segura daqueles fóruns, distorcendo minha misoginia internalizada como se fosse uma crítica ao patriarcado. Um truque muito esperto! Na verdade, por mais que eu ache a linguagem meio brega e pudica e as neuroses um tanto perigosas (eu mesma precisei me proibir de acessá-los por um tempo, para ver se eu parava de pesquisar todas as minhas curiosidades e tomava um pouco de fôlego), agora já faço parte do grupo que viveu esse estranho e particular ciclo de tentar engravidar e não conseguir de imediato. E sei, em primeira mão, que todos os tipos de mulheres são estimuladas a ter filhos, e não é nada além de normal ficar especulando, depois de tomar uma das maiores decisões da sua vida, se isso deu certo ou não, e depois ficar frustrada se a resposta for não.
Por mais que tenha ficado constrangida no passado pelo meu desejo de ter filhos, fico mais envergonhada agora por ter tido tanta dificuldade de parar de ver minhas escolhas pessoais como um exercício de branding. Afinal, cheguei a uma decisão desobrigada, com o Avi, que ter filhos é algo que valorizo e desejo na minha vida, e que não acredito que vou ser menos útil, determinada ou íntegra [se tiver filhos], da mesma forma que escolher outro caminho também não vai fazer. Mas nas minhas tentativas de me afastar da noção sexista de que a maternidade diminui as mulheres, acabei por reforçá-la.
Estava com tanto medo das tentativas, do desejo, do sacrifício. Da feminilidade brutal de tudo isso. Mas essas coisas só são vergonhosas através de uma lente superficial e limitante e agora, finalmente, felizmente, estou perdendo o interesse de me olhar através dela.
Haley Nahman é escritora e editou por anos o site Man Repeller. Hoje, ela comanda a newsletter Maybe Baby e recentemente tem compartilhado seu processo de tentar engravidar. O texto original foi traduzido por Anna Vitória Rocha e editado para se adequar ao formato do nosso blog. Clique aqui e leia o material na íntegra: Who’s Allowed To Want Kids?